Eu nunca tenho
em mãos a chave para abrir a portaria do prédio aqui em Montevidéu. Quem me
salva está lá dentro, sentado em uma cadeira dura e cercado por um balcão
preto. Talvez fosse o caso de comprar uma poltrona por causa do conforto. Eu
poderia sugerir isso na reunião do condomínio, desde que eu soubesse dos
eventuais encontros entre os vizinhos e desde que eu não fosse um viajante de
estadia curta.
Onomatopeia de
portão se abrindo. Quem mais uma vez me salva já se levantou e está com as
palmas das mãos abertas e braços esticados em direção ao elevador, que já está a
minha espera no térreo. Sorrio para a cena inusitada e recebo uma breve
gargalhada rouca. “Bueno, como andas??”, diz o senhor Alberto, 77 anos, 14 dos
quais dedicados ao apartamento de 15 anos de idade na rua Benito Blanco. Sua
voz pode ser escutada de longe, até mesmo do segundo andar.
Ele tem,
confesso, essa mania de me apontar os caminhos. Quando estamos sem assunto e
aguardo o elevador pisar no “T”, pergunta se estou estudando. Respondo
afirmativamente e ele faz uso magistral da réplica: “Hay que estudiar! Es
la llave para todo”. Sorrio,
nos despedimos e subo.
Um dia desses
eu descia e lá estava señor Alberto dentro do elevador. Era seu aniversário e
levava uma garrafa de vinho no encontro do braço com o sovaco. Parabenizei-o e
recebi um aperto de mão e abraço sinceros. Ele tem um apreço natural pelos
brasileiros e, é bom frisar, nutre uma certa antipatia pelos argentinos. Como
larga às 22h, tem tempo para acompanhar as produções brasileira na tv. “Novela
brasileira! Está muy buena”, diz com tons de entusiasmo quando me vê chegar à
noite.
Invariavelmente,
Señor Alberto puxa conversa sobre como está frio, feio ou bonito o tempo lá
fora. Não gosta de falar muito sobre o Danúbio, seu time do coração, talvez
porque não saiba que gosto muito de futebol. Costuma vestir calça longa, sapato
social e um suéter com vários losangos desenhados mesmo nos dias em que
Montevidéu vira o Saara.
Señor Alberto é
um pouco reaça, nada que o impeça de ser uma grande pessoa. Gosta da Dilma
porque ela “bota a polícia para ir atrás dos traficantes nas favelas”. E eu
poderia muito bem dizer: “Bueno, hay que estudiar...”.
Um desses dias
comentava que volto a Maceió em dezembro, mas que tenho vontade de voltar,
especialmente para conhecer o carnaval. “Mas você vai ficar aqui no
apartamento?”, pergunta. “Não, não, mas voltarei para cumprimenta-lo”.
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