quinta-feira, 23 de junho de 2016

banquete junino

A família assume a mesa, farta de comidas, aperitivos e engolida por uma coberta xadrez, quadrada e laranja e branca. A mãe soma escondidinho de carne de sol (carne-de-sol?) ao prato; o tio avança e escolhe o cuscuz com salsicha enquanto o pai joga leite sobre o prato de forma acelerada. Ao lado, em sua cadeira de alimentação, o rapazinho de dois anos ousa brincar:

- Tati, você vem comer aqui do meu lado?
- Tati, você vem comer aqui do meu lado? – repete


A mesa sorri descabreada. Tati é a babá e babás, como se convencionou, têm menos pressa para comer. 

quinta-feira, 26 de maio de 2016

a grande magia

bola ao chão e eles
viraram amigos sem
trocar uma palavra

domingo, 22 de maio de 2016

dica preciosa

minha mãe disse
chora que lágrimas
não causam dor

cri cri

grilos não cobram
couvert artístico
às flores

sexta-feira, 20 de maio de 2016

o baile das bocas

dois beijos pra
lá duas mordidas
pra cá. entendeu?

quinta-feira, 19 de maio de 2016

cacofonia

som emitido pelos
meus cacos que
tentam se recompor

domingo, 15 de maio de 2016

céu de brigadeiro

tudo escuro e os
granulados caem
lentamente

aula de música

trocadilho é colocar
as letras em uma
roda de samba

quarta-feira, 11 de maio de 2016

matemática desnuda

tirando o b de Bhaskara
calculo que ficam lisas
as kara quando te vejo

o menino da flanela vermelha

Baby, você não sabe o que me ocorreu, baby. Eu tentava ajeitar o som, passava pelo álbum da Gal, Chico, Caetano, Nação Zum... esse, vai ficar nesse, quando o semáforo optou por ficar fechado, acompanhando o tempo. Foi mais ou menos um minuto, baby. eu estava ali parado, imóvel e troquei de expressão com o garotinho de uns oito anos. Uma polo listrada nas cores azul e branca, ele vestia. Não tinha uma garrafa com água ou um rodo. Puxou uma flanela vermelha e acariciou um dos retrovisores. Ele me olhava como quem pedia licença. Me ajudava muito naquilo que conseguia fazer. O sinal abriu. São Pedro e eu não resistimos.

terça-feira, 10 de maio de 2016

de onde nunca saí

me contaram que
o circunflexo é uma casa
eu moro no silêncio

terça-feira, 3 de maio de 2016

domingo, 1 de maio de 2016

ciências humanas

quero me perder
na floresta temperada
dos teus cachos

sábado, 30 de abril de 2016

português descomplexo

Minha oração coordenada
aditiva leva meu olho
ao teu 

sexta-feira, 1 de abril de 2016

matemática revolucionária

explorar mais e
dividir jamais
o multiplicar fugaz:
subtrair a paz

na periferia

"Extratificação social"
Tem cor
Vermelha

domingo, 27 de março de 2016

a calçada

fico só vendo
teus pés
zigue zagueando
perto da canela
da cadeira

eles ficam ali
direita-esquerda
esquerda-direita
hipnotizadores
enfim

e os chinelos
(perdidos)
já não sabem mais
que calçam
dois

e a vida própria
deles acaba
quando se enfiam
e se enrolam
suavemente

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Ó lá o Olaf

Luiz veste uma camisa verde longa. Ela vai até os pulsos; ela é daquela para proteger do sol. Está mascarado do branco do protetor solar, embora o carnaval tenha passado. Vai até o vidro da porta e repete ho, ho, ho, prentendendo ser o papai Noel mais jovem de que se tem conhecimento. As orelhas grandes prendem melhor o mundinho de palavras que a gente libera.

Na água, aprendeu a se equilibrar no balançar das boias. Tem dois anos e, com seus braços, espanta os dos outros de perto. Dispensa a piscina para correr atrás da bola. Há uma imagem do Olaf, aquele bonequinho de gelo do filme Frozen, nela. É dividida pelo calor e gelo.

Da piscina, rebato seus arremessos de fora dela. Cabeceio para longe e digo Ó la o Olaf até que se localize e persiga a bolinha uma vez mais, tropeçando mais que correndo. Finjo que estou ratando a bola; Luiz gargalha, Clarinha o segue. As crianças podem ver a felicidade em tudo. Ele pede para repetir, ri e embola. E ri, ri, ri...

sonora


A palavra silêncio emite muitos sons

O circunflexo dá a força, dita o ritmo

Reforma ortográfica nenhuma pode mudá-la

Isso está certo

Mas...

Falando em silêncio, meu bem

Qual seria a graça de um

Que não fizesse barulho

Que não tivesse olhos

Que não se apagasse perturbador

Como o seu

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

A gente se
queixa da deixa
que não fecha

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

bloqueei o criativo

Minha vontade era deitar na rede e escrever. Sentar no banco da praça e escrever. Em casa, a cachorra começa a latir e me desconcentra. Certamente haverá de chover na praça ou o banco gemerá da quentura. Não vale o risco. Meu bloqueio é permanente porque a gente tem medo de pensar muito. Observar é ser louco à vista de quem passa. Recorro a imagens que nunca vi, como a parte interna do meu cérebro. As palavras estão guardadas ali. Eu as vejo voando dentro de um lugar escuro. Absorvo muito do que leio, embora não me lembre de quase nada. As influências e palavras se perdem dentro de mim, e ficam longe. Agora, margeiam minhas mãos. Tento agarrá-las e se desprendem. As mais lentas estão em abundância. Odeio rotinas como se sabe. Sou inquieto, persigo as metidas afora, populares metáforas. Esboço uma aproximação e me escapam. Refaço o trajeto confiante, agora tenho o mapa: as palavras se misturam, engravidam e será preciso esperar. Não saio da cama.

domingo, 10 de janeiro de 2016

Choveu desgraçadamente. Eu estava completamente encharcado e esperando pelo show do Ney Matogrosso. Os patetas contratados pela prefeitura anunciaram o adiamento - ou cancelamento, como queiram. Ficamos todos putos. As pessoas começaram a vaiar. Fui buscar o carro, que estava longe, a uns cinco quarteirões dali. Como um sanduíche no caminho, chego em casa e tomo um banho. Não quero ver filme, penso. Ensaio ler Galeano: não passo de duas ou três páginas. Avançaria pouco hoje. Peguei Bella, a cachorra, para passear comigo no carro e comprar algumas cervejas. Há um posto por perto que sempre está aberto, reduto dos bêbados da madrugada. De volta, ponho Clube da Esquina para tocar enquanto tomo umas goladas. Os vizinhos dormem, o silêncio paira e minha mente inquieta começa a produzir. Precisava de mim mesmo uma vez mais.

domingo, 3 de janeiro de 2016

intensidade

Houve uma menina
cujo abraço apertava
apertava
e durava
feito cheiro de livro novo
e um olho que ardia
ardia
como sabão no olho
Dizem por aí
que isso faz bem
muito bem
acalma a alma
Mas eu costumava
ir a um ponto
e não mais
voltar